Bunkyo / Kokushikan: a história do sócio-fundador Kazuo Harasawa

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A tocante trajetória de Kazuo Harasawa, um imigrante pós-guerra de Niigata dedicado às entidades nipo-brasileiras e que dá nome a um dos legados da imigração japonesa.

Trata-se da construção do Pavilhão1, junto ao local onde são instaladas as tendas do Sakura Matsuri como parte do projeto de sustentabilidade financeira do Parque Bunkyo Kokushikan, uma das unidades do Bunkyo – Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa e de Assistência Social.

No dia 8 de maio de 2015, menos de uma semana depois de completar 91 anos de idade (nasceu em 2 de maio de 1924), Kazuo Harasawa solicitou uma reunião com a então presidente do Bunkyo, Harumi Arashiro Goya. Participaram desse encontro também os vice-presidentes Jorge Yamashita e Osamu Matsuo, além do secretário administrativo Eduardo Nakashima.

Comemorava-se nesse ano, além dos 120 anos do Tratado da Amizade Brasil-Japão, o aniversário de 60 anos de fundação do Bunkyo.

Entre os assuntos tratados, Harasawa, um ilustre veterano (além de sócio-fundador da entidade), discorreu sobre a importância da preservação da história e dos ensinamentos do passado. Comentou sobre as comemorações daquele ano e retomou um tema que lhe preocupava há um muito tempo: a sustentabilidade do Centro Esportivo Kokushikan (atual Parque Bunkyo Kokushikan).

Em 1996, na gestão do presidente Atushi Yamauchi, quando iniciaram as tratativas para cessão do Kokushikan ao Bunkyo, e até 1997, quando se oficializou a doação, Kazuo Harasawa era presidente do Conselho Deliberativo da entidade e, portanto, participou ativamente das negociações.

Uma propriedade como o Kokushikan, com um magnifico Ginásio de Esporte, não podia “continuar assim, sem um projeto consistente, só acarretando despesas de manutenção”. Imaginava, por exemplo, que o Ginásio de Esportes poderia ser reformado e se transformar num amplo salão para eventos sociais.

Ao final da reunião, sem pestanejar, anunciou que pretendia doar o montante de um milhão de reais para auxiliar nas possíveis reformas do Ginásio.

Um misto de surpresa e admiração pela generosidade do interlocutor envolveu os presentes, ao mesmo tempo, um certo receio de não corresponder às expectativas do doador. Assim, a proposta passou a ser tratada com certa discrição pela diretoria para não provocar alarde e tratar dos planos das obras com o devido comedimento.

Em 2018, durante os preparativos para a comemoração dos 110 anos da imigração japonesa no Brasil, o foco se voltou ao Kokushikan.

O Comitê Executivo da Comissão Organizadora dos Festejos, sob a presidência de Yoshiharu Kikuchi, decidiu que parte da arrecadação seria destinada às obras de sustentabilidade do Kokushikan. “Este será o legado da comunidade nipo-brasileira às gerações futuras”, ressaltou o Kikuchi. “Adotamos como tema desta comemoração os sentimentos Gratidão e Esperança. A nossa Gratidão aos pioneiros que formaram a base da sociedade nikkei e ao Brasil que nos acolheu. E Esperança que os 110 anos abram novos caminhos para nossa comunidade”, completou.

Em outubro de 2018, foi apresentado oficialmente o Plano Diretor de Ocupação Arquitetônica e Paisagística do Parque Kokushikan concebido pelo arquiteto Eiji Hayakawa e estabelecido como meta inicial a construção do Pavilhão 1 no local onde vem sendo realizado, desde 1997, o Festival das Cerejeiras – Sakura Matsuri, com orçamento de 3 milhões de reais.

O valor destinado pela Comissão Organizadora foi anunciado por Kikuchi, presidente do Comitê Executivo – 2,5 milhões de reais, valor arrecado por meio de venda de rifas de carros da Toyota e da Honda e de contribuições por meio do Livro de Ouro. Dessa forma, caso concretizasse a doação prometida por Kazuo Harasawa, a construção poderia se viabilizar. A questão é que ele havia falecido em 13 de agosto de 2017.

Após várias rodadas de conversa, os novos diretores e as testemunhas da promessa de Kazuo Harasawa decidiram conversar com a família dele.

Cerimônia Muneague do Pavilhão Kazuo Harasawa dia 17 de novembro de 2019. Família Harasawa representada pela viúva, Kaneko, e os filhos, Carlos e Lucy. Presenças do presidente do Bunkyo, Renato Ishikawa e do cônsul geral adjunto Akira Kusunoki. Créditos da foto: Aldo Shiguti

Sem muitas delongas, os herdeiros concordaram em atender ao desejo do patriarca. Carlos Harasawa conta que um dos sonhos do pai era oferecer melhores condições ao Kokushikan visando torná-lo sustentável e em condições de uso para toda a comunidade. “Infelizmente, não conseguiu realizar esse sonho em vida”, lamentou e, por conta disso, “a família decidiu atender ao desejo dele, mesmo com uma contribuição modesta, apoiado esta iniciativa de resultado perene”.

Quem foi Kazuo Harasawa

Líder dedicado às entidades nipo-brasileiras e que até os seus últimos dias se manteve fiel e atento à preservação dos ideais e valores dos pioneiros, um legítimo guardião do legado da imigração japonesa deste país.

Foto: Kazuo Harasawa, um dos homenageados especiais das comemorações dos 60 anos de construção do Pavilhão Japonês, em 2014.

Kazuo Harasawa deixou a província Niigata, sua terra natal, em 1952, aos 28 anos de idade. Na bagagem, a “carta de chamada” enviada pelo irmão Fumio Harasawa que já se encontrava no Brasil e outra carta de apresentação assinada pelo diretor do colégio onde estudara endereçada a Kiyoshi Yamamoto que, coincidentemente, foram estudantes da mesma universidade.

Kiyoshi Yamamoto, gerente da poderosa Fazenda Tozan, um dos mais destacados líderes do pós-guerra, estava comprometido em fortalecer o intercâmbio Brasil-Japão e apaziguar os conflitos internos da comunidade.  Além disso, nessa época, estava focado na participação dos imigrantes japoneses (e consequentemente do Japão!) nas comemorações do 4º Centenário da Cidade de São Paulo, marcadas para 1954.  Graças aos esforços de todos, foi construído o Pavilhão Japonês (pelo governo japonês e comunidade nipo-brasileira), no coração do Parque Ibirapuera.

No ano seguinte, Yamamoto liderou o movimento de fundação de uma entidade representativa da comunidade nipo-brasileira. Assim, em dezembro de 1955 nasceu a Sociedade Paulista de Cultura Japonesa (depois, em 1969 mudou a denominação para Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa).

Kazuo Harasawa, em 1955, juntamente com Fumio, fundou a empresa Irmãos Harasawa dedicada às atividades comercial na zona cerealista de São Paulo.

A carta de recomendação do diretor de 1952 criou laços definitivos com Kiyoshi Yamamoto, e com diferentes entidades – durante muitos anos, enquanto sua saúde permitiu, Harasawa fez questão de preservá-los e buscou colaborar com todas elas.

No Pavilhão Japonês, monumento ícone do intercâmbio Brasil-Japão, foi vice-presidente e dedicou-se também para difundir o nishikigoi (carpas coloridas) junto à entidade. Nos anos de 1990, atuou para doação de exemplares de carpas pelo governo de Niigata.

No Bunkyo, foi um dos 415 sócios-fundadores e, desde 1971, atuou junto ao Conselho Deliberativo (órgão do qual presidiu em 1992 e depois de 1995 a 1998) e foi membro do Conselho Superior de Apoio e Orientação.

Também contribuiu junto à diretoria do Enkyo (Beneficência Nipo-Brasileira de São Paulo) desde a sua fundação nos anos de 1960, chegando a ocupar a presidência da entidade.

Defensor intransigente das atividades comunitárias, Kazuo Harasawa foi um dos fundadores do “Kyodo-kai”, em 1956, para acolher os imigrantes da província de Niigata e que, em 1960, resultou na Associação Cultural Niigata do Brasil.

Assim foi Kazuo Harasawa, um líder dedicado às entidades nipo-brasileiras e que até os seus últimos dias se manteve fiel e atento à preservação dos ideais e valores dos pioneiros, um legítimo guardião do legado da imigração japonesa deste país.

E foi com esse mesmo espírito e propósito que seu nome está eternizado no Pavilhão 1 construído como um dos legados dos 110 anos da imigração japonesa no Brasil.

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