Teatro: O Universo Nô e Kyoguen

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teatro no e kyoguenNos dias 1 e 2 de julho, às 21h, o Teatro Paulo Autran, no SESC Pinheiros, recebe algumas das manifestações teatrais mais antigas do Japão – o teatro Nô e o Kyoguen. Além das apresentações ao público; profissionais e estudantes de teatro e dança terão a oportunidade de participar de um workshop no dia 2, às 17h. Os ingressos já estão à venda em toda a rede SESC e na bilheteria do teatro (R$40,00 e R$ 20,00 – estudantes e aposentados).

Teatro Nô e Kyoguen

O Nô é uma das manifestações teatrais mais antigas do Japão. Zeami Motokiyo (1363-1443) é o codificador maior desta arte que combina canto, dança, poesia e música de uma maneira refinada e altamente simbólica. O Teatro Nô pode ser considerado a síntese da cultura japonesa, por excelência. Com sete séculos de história, o gênero conserva uma estética cênica rigorosa, potencializando o máximo de significação com o mínimo de expressão. Em 2001, a Unesco reconheceu o teatro Nô como Patrimônio Cultural Intangível da Humanidade.

O teatro Kyoguen foi desenvolvido em conjunto com o teatro Nô, durante o período Muromachi (1337-1573). Em conjunto, são denominados Nôgaku.

O Nô é um drama simbólico e estilizado, de refinada elegância. O conceito que o representa é denominado “yuguen”, que significa uma beleza elegante, refinada e indescritível. Os seus temas geralmente são inspirados em temas da literatura clássica ou passagens da história e é estruturado em torno da música e da dança. O universo nô é habitado por deuses, guerreiros e mulheres enlouquecidas, às voltas com os mistérios do espírito.

Oposto ao Nô, o Kyoguen explora temas do cotidiano das pessoas comuns ou contos populares. Seu personagem principal é um serviçal chamado Taro Kaja e evoca um humor delicado e divertido. O kyoguen revela os defeitos do ser humano com comicidade. Conflitos entre patrões e empregados, intrigas entre marido e mulher, um esperto querendo passar a perna em um ingênuo são temas constantes no universo kyoguen. Geralmente é apresentado nos intervalos de peças nô.

Tanto o Teatro Nô como o Kyoguen utilizam o mesmo palco. O Nô, através da busca de um ideal de beleza simbólica, e o Kyoguen, através de uma expressão realista do humor, retratam a verdadeira essência da natureza humana, em tons burlescos.

As cerca de duzentas peças do repertório de nô tratam de altas personalidades históricas e culturais ou de temas universais: a morte, o amor, o ódio, o ciúme, a espera e a efemeridade da vida. Alguns dramas nô bastante conhecidos são: Deus Okina, Takasago, Hagoromo (Manto de plumas), Guerreiro Kiyotsune, Sumidagawa (Rio Sumida) e Funa-Benkei (Benkei no barco).

O Palco

O Nô e o Kyoguen se desenrolam sobre o No-butai, ou literalmente, palco Nô, que tem características muito próprias. No Japão, ele se parece um com santuário, com três lados abertos em torno do palco principal chamado hon-butai, um quadrado de aproximadamente 6 metros em cada lado. Há quatro pilares de madeira, chamados de metsuke-bashira, importante referência visual para o ator se posicionar no palco. O fundo do palco é chamado de Kagami-Ita, ou placa-espelho, onde é pintado um antigo pinheiro. Músicos e o coro se sentam ao fundo e à direita do palco. No lado oposto, o Hashi-gakari, é uma ponte por onde os personagens entram e saem, e é também um importante espaço cênico. Ao fundo da ponte fica o Ague-maku, uma cortina colorida. Sem visão do público, o Kagami-no-Ma, ou sala do espelho é um espaço importante onde os artistas, já vestidos e prontos para entrar em cena, fazem sua última concentração.

O palco é feito de madeira lisa, sobre o qual os atores deslizam. Trata-se de um movimento chamado de Suri-ashi.

Os atores

Há quatro categorias de atores no teatro Nô e Kyoguen: o shite (ator principal), o waki (ator coadjuvante), o hayashi (músico), e o ator kyoguen. O shite é o único ator que atua com máscara, e desempenha vários papéis. Podem ser guerreiros, os espíritos destes guerreiros, mulheres, deuses ou demônios.

O ator waki apoia o shite, e não usa máscara. Podem fazer o papel de sacerdotes, monges, ou um samurai, mas sempre são personagens reais, que vivem.

Já a orquestra de nô (hayashi) é formada de quatro instrumentos musicais: tamboril pequeno (kotsuzumi), de som grave, que contrasta com o tamboril grande (otsuzumi ou okawa), de som agudo e quase metálico, uma flauta de bambu (nôkan) e um tambor de baquetas (taiko). E o coro (jiuta) é composto de seis a dez elementos.

As máscaras

O teatro Nô é conhecido também como o Teatro de Máscara, tamanha a importância deste adereço em seu universo cênico. As máscaras do teatro Nô foram criadas no período Azuchi-Momoyama (1573 até 1603) e há registro de 60 tipos diferentes. Há máscara para cada tipo de personagem, mas é comum o ator principal escolher a máscara mais adequada para sua função.

As máscaras são esculpidas de tal forma que o real e o fantástico são engenhosamente combinados para produzir uma beleza sutil. Dependendo do movimento do ator e do ângulo que se dá à máscara, ela pode expressar feições diferentes no palco.

O Teatro Nô nos 120 anos de amizade Brasil-Japão

O Brasil e o Japão celebram em 2015, os 120 anos do estabelecimento das relações diplomáticas. Para comemorar o ano, o Consulado Geral do Japão em São Paulo sugeriu uma apresentação de teatro Nô, pois sua expressão representa a essência da cultura japonesa.

Com o apoio da Japan Foundation, o grupo que vem com esta missão ao Brasil é composto por 14 atores e músicos, liderado por Wakebayashi Michiharu, ator Nô da escola Kanze. Também integra a trupe, o ator kyoguen Ogasawara Tadashi, que já esteve no Brasil se apresentando em outras ocasiões, inclusive no SESC.

O grupo

O grupo é formado por 14 artistas, atores de teatro Nô e Kyoguen e músicos, pertencentes a várias escolas ou estilos.

WAKEBAYASHI MICHIHARU – ator principal de Nô, escola Kanze
UZAWA HIKARU – atriz Nô, escola Kanze
FURUHASHI MASAKUNI – ator Nô, escola Kanze
MIKATA SHIZUKA – ator Nô, escola Kanze
UMEDA YOSHIHIRO – ator Nô, escola Kanze
TAKEDA HIROSHI – ator Nô, escola Kanze
HARA MASARU – ator Nô, escola Takayasu
HARA RIKU – ator Nô, escola Takayasu
SAKO YASUHIRO – músico Nô (flauta), escola Morita
FURUTA TOMOHIDE – músico Nô (tamboril pequeno kotsuzumi), escola Kô
TANIGUCHI MASATOSHI – músico Nô (tamboril grande ôtsuzumi) , escola Ishii
INOUE KEISUKE – músico Nô (tambor taiko), escola Kanze
OGASAWARA TADASHI – ator Nô Kyoguen, escola Izumi
IZUMI SHINYA – ator Nô Kyoguen, escola Izumi

Peça de Kyoguen
Neonguioku (Cantando Deitado)
Autor: desconhecido
Época de concepção: século 17 (início da Era Edo)
Personagens: Serviçal (Taro Kaja) e o Patrão
Tempo de duração: 25 minutos

Taro Kaja estava cantarolando, ainda sob o efeito do álcool da noite anterior. Seu patrão espreita o serviçal, até que o convida a cantar na sua frente. Taro Kaja não gosta da ideia, por acreditar que o patrão irá repetir o pedido sempre que o ouvir cantar e inventa uma série de condições para satisfazer o amo. Diz que é preciso estar bêbado para cantar, ou que é preciso estar no colo da mulher, para que a sua voz saia cristalina. Aí começa um duelo entre patrão e serviçal, embalado por canções entoadas deitado, uma habilidade que só atores bem treinados conseguem desempenhar.

Peça de Teatro Nô
Funa-Benkei (Benkei no barco)
Autor: Kanze Kojiro Nobumitsu
Época de concepção: período Muromachi (1337 a 1573)
Duração: 70 minutos

Funa-Benkei será a peça principal do espetáculo, apresentada em duas partes com um interlúdio, chamado Ai Kyoguen. Na primeira parte – Tristeza de Shizuka – Yoshitsune e Yoritomo, os irmãos líderes do clã Guenji, acabam de ganhar a guerra contra o clã Heike. Por conta de um boato mentiroso, Yoritomo acredita que seu irmão o esteja traindo. Por isso Yoshitsune foge numa viagem perigosa que o obriga a separar-se de Shizuka, sua mulher. Na segunda parte – Luta contra o fantasma – durante sua viagem marítima, Yoshitsune é atacado pelo fantasma de Taira no Tomomori, samurai da família Heike morto pelo próprio Yoshitsune. Ao final, o fantasma vencido desaparece no branco das espumas das ondas.

Sinopse

Embora Minamotono Yoshitsune tivesse contribuído na aniquilação do clã Heike, seu irmão Yoritomo suspeitou sua traição, e Yoshitsune passou a ser perseguido pela autoridade de Kamakura. Yoshitsune, planejando fugir para as províncias ao oeste de Kyoto, chega até a baía de Daimotsu, na província de Settsu (correspondente à atual região do norte de Osaka e sudeste de Hyogo), junto com seus fieis servos, dentre eles, Benkei. Shizuka Gozen, concubina de Yoshitsune, também estava acompanhando o grupo. Porem havia muitas dificuldades para uma mulher continuar numa jornada tão árdua e ela acabou retornando a Kyoto conforme os conselhos de Benkei. No banquete de despedida, Shizuka exibe a sua dança, orando pelo futuro de Yoshitsune, desejando o reencontro. Shizuka despede-se de seu amado em lágrimas.

Benkei ordena forçosamente a partida do barco, visto que Yoshitsune estava hesitante em continuar a fuga, tomado pela tristeza da despedida. Tão logo o barco saiu ao alto-mar, este é repentinamente atingido por uma tempestade, e os espectros do clã Heike, derrotados por Yoshitsune na Batalha de Dan’noura, surgem sobre as ondas. Entre eles, o espírito vingativo de Taira-no-Tomomori, general do clã Heike naquela batalha, atacou Yoshitsune com seu naguinata (arma formada pela junção de uma lâmina na ponta de uma longa haste), tentando a todo custo, afundar Yoshitsune nas profundezas do mar. Benkei esfrega suas contas budistas e ora desesperadamente para as Cinco Divindades. A oração fez efeito, e os espectros foram exorcizados ao amanhecer, desaparecendo além do horizonte, restando apenas suaves ondas ao mar.

Destaques

É uma peça de Nô de fácil entendimento, com a participação de personagens amplamente conhecidos do público japonês, como Yoshitsune, Benkei e Shizuka Gozen. A trama tem Benkei, um monge e subordinado de Yoshitsune, como centro, e se desenvolve num ritmo dinâmico.

Nesta peça, o Shite (ator protagonista) interpreta dois papéis totalmente diferentes, sendo uma bela shirabyôshi (dançarina vestida de homem) na parte inicial, e um assustador espírito vingativo na parte final. Há a representação do contraste entre a beleza e a bravura. Durante o Maeba (parte inicial da peça), os espectadores podem apreciar uma dança graciosa. Já no Nochiba (parte final da peça), há movimentos ásperos e agressivos, manuseando o naguinata, uma lâmina montada numa haste comprida. A intensidade e o andamento do Utai (canto) e do Hayashi (acompanhamento musical) também são totalmente diferentes entre as duas partes. É uma peça extremamente dramática, com muitas variações.

A evolução do cenário, da baía de Daimotsu para o alto-mar, é representada apenas com um barco estilizado. Este é o momento de destaque do Ai (narrador de Kyogen, que eventualmente pode representar um papel de destaque, como nesta peça), interpretando o condutor do barco, que interage com os Waki (personagens coadjuvantes) enquanto rema o barco, e mostra seu braço de condução quando se inicia a tempestade. Por meio da contemplação de seus movimentos, o público terá uma real sensação do mar agitado.

SERVIÇO

O Universo Nô e Kyoguen
Evento oficial em comemoração aos 120 Anos do Tratado de Amizade Brasil-Japão
Apresentações: dias 1 e 2 de julho, quarta e quinta-feira, às 21h
Local: Teatro Paulo Autran, SESC Pinheiros
Rua Paes Leme, 195 – Pinheiros – São Paulo – SP (próx. à Estação Faria Lima do Metrô)
Ingressos: R$ 40,00 e R$ 20,00 (estudantes e aposentados)
Disponíveis em toda a rede SESC e na bilheteria do teatro
Workshop: dia 2 de julho, quinta-feira, às 17h (destinado especialmente a profissionais e estudantes de dança e teatro)
Informações: (11) 3095-9400

Realização: SESC SP – Serviço Social do Comércio
Produção: Dô Cultural
Apoio Cultural: Consulado Geral do Japão em São Paulo | Japan Foundation | Câmara de Comércio e Indústria Japonesa do Brasil
Patrocínio: Nihon M&A Center Inc. | H.I.S. Co. Ltd. | Wakebayashi Yasuhiro (Chairman, Nihon M&A Center Inc.)
Colaboração: Associação Brasileira de Nôgaku

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