Na tarde do dia 30 de janeiro último, durante a cerimônia de outorga do Diploma de Reconhecimento do cônsul-geral do Japão do 28º ano da Era Heisei, realizada no gabinete do cônsul-geral Takahiro Nakamae; Seiji Ito, vice-presidente da Comissão de Administração do Pavilhão Japonês, não fez questão de esconder sua imensa felicidade por ter sido escolhido para receber a honraria.
Ao lado dele, Michinori Murasaki recebeu a mesma condecoração por ter atuado, durante 20 anos, como administrador do Monumento em Homenagem aos Imigrantes Falecidos do Parque Ibirapuera, de acordo com nota do Consulado Geral do Japão “um pilar simbólico e espiritual dos imigrantes japoneses que vieram ao Brasil”.
Desta feita, ao homenagear personalidades nikkeis com o Diploma de Reconhecimento, o cônsul-geral Nakamae elegeu dois voluntários dedicados aos cuidados de “pontos tradicionais de visitação por ocasião de autoridades japonesas, incluindo a Família Imperial”.
Ao relacionar os “principais fatos meritórios” de Seiji Ito para outorga do Diploma de Reconhecimento, afirma o Consulado que “atuando como guia dos visitantes da Casa Imperial e de pessoas ilustres, veio transmitindo o fascínio e os antecedentes históricos do Pavilhão”. Ressalta ainda que, durante a reforma do Pavilhão, “como responsável do Bunkyo pela execução, manteve minuciosas reuniões com a empreiteira resultando no sucesso da restauração”.
A chegada de Seiji Ito ao Brasil
Ito-san, como é conhecido por todos, “é o nosso voluntário exemplar e ficamos extremamente honrados com o reconhecimento do Ministério das Relações Exteriores a sua incansável dedicação de longos anos como voluntário, não somente junto à nossa entidade, como também em muitas outras organizações”, afirma a presidente do Bunkyo, Harumi Arashiro Goya.
Lembra que, dos 63 anos desde a construção do Pavilhão Japonês, há 53 anos Seiji Ito colabora com as atividades desse local.
Ele chegou ao Brasil em 1954 – no mesmo ano da construção do Pavilhão – e foi com a família para o interior do Amazonas, em Manacapuru, localizada a 90 km da capital; deixando Omagari, uma cidade da província de Akita, região de frio intenso em determinada época do ano, por uma região de calor intenso todo ano.
Conta que o pai, engenheiro agrônomo, e a mãe, professora universitária, vieram para “ajudar os imigrantes” a pedido de Kotaro Tsuji, um dos líderes da imigração japonesa pós-guerra na região norte. O casal veio acompanhado de cinco filhos e, o caçula Seiji, com 16 anos de idade, acabara de terminar o curso ginasial.
As condições locais fizeram com que, em pouco tempo, a família mudasse para o Pará, primeiro para Tomé-Açu e, em seguida, para a capital Belém. Passados cerca de sete anos da chegada, a família Ito estava em São Paulo planejando mudar-se para Córdoba, na Argentina, onde residia seu tio, relembra Seiji Ito.
No entanto, acabaram indo para Suzano trabalhar na granja que pertencia ao cunhado de Tokuya Hiruta, empresário conhecido entre os nipo-brasileiros por ser proprietário do Jornal Paulista, primeiro jornal a ser fundado logo após o final da Segunda Guerra. A família Ito o conhecia graças à indicação de parentes do Japão. Depois de poucos anos, acabaram mudando-se para a capital paulista e montando uma pensão na Avenida Conselho Furtado.
No Pavilhão, um dia muito frio
Seiji Ito, 79 anos, lembra que conheceu o Pavilhão Japonês em 1955, ciceroneado por Tokuya Hiruta, em sua primeira visita a São Paulo. “Tinha chegado do Amazonas e trajava um terno de linho, mas São Paulo fazia um frio tremendo e Hiruta, penalizado, me levou para uma loja e me presentou com um suéter”, conta. Lembra que, desde essa época, ficou muito impressionado com a história da construção do Pavilhão Japonês.
Anos depois, quando a família mudou-se para São Paulo, Seiji Ito trabalhou um tempo na Livraria Sol (Tayodo) e depois, em 1963, foi para a Cooperativa Agrícola Sul-Brasil, onde ficou até sua aposentadoria.
Relembra que trabalhava no setor de alimentos para aves e animais e tinha contato com o setor de fertilizantes. “Naquela época, não só na Sul-Brasil, mas em outras empresas mantidas por nipo-brasileiros, era comum o presidente destacar alguns funcionários para auxiliar as entidades em ocasiões especiais”, conta Seiji Ito. “Já que o presidente não tinha tempo, ele nos destacava para atuar no lugar dele”.
De acordo com ele, era um “misto de voluntariado” porque tinha permissão para trabalhar no horário de expediente, mas se o evento prosseguisse no final de semana, por exemplo, a empresa não pagava a hora-extra.
Seiji Ito foi destacado pelo presidente da Sul-Brasil, Guenichiro Nakazawa (que ocupou a presidência do Bunkyo de 1975 a 1979) para cuidar das plantas do Pavilhão (adubação, poda e plantio), ocasião em que atuou ao lado do famoso botânico Goro Hashimoto, fundador do Centro de Pesquisas de História Natural, sediado em Itaquera, na zona leste de São Paulo.
Nesse mesmo esquema, ele passou a atuar também junto à Beneficência Nipo-Brasileira (Enkyo), Assistência Social D. José Gaspar Ikoi-no-Sono e Abeta – Associação Brasileira de Estudos Técnicos Agrícolas, estreitando os laços com os encarregados delas e firmando-se com um dos seus assíduos voluntários.
Em seu currículo de voluntário, também destaca-se a atuação junto à Associação Cultural e Recreativa Akita Kenjinkai do Brasil durante cerca de 23 anos, chegando a ocupar a vice-presidência da entidade; na Federação Paulista de Beisebol e Softbol onde atuou como juiz durante cerca de 22 anos e também como membro da Associação Amigos dos Filatelistas (com uma invejável coleção de selos).
Dessas entidades, certamente, o relacionamento com a Associação Brasileira de Nishikigoi – ABN, fundada em 1978, continua sendo o mais intenso e duradouro. Conta que, em sua terra natal, um dos seus tios é criador de carpas coloridas e, portanto, já tinha algum conhecimento, mas que, a partir da convivência com os criadores no Brasil, interessou-se em aprofundar esses estudos.
E foram as carpas coloridas que proporcionaram a ele aprofundar e ampliar o relacionamento com o Pavilhão Japonês, que é mantido até os dias atuais.
O incremento da criação das carpas remonta à reforma do lago para receber os primeiros exemplares doados pelos criadores japoneses, em 1980, ocasião em que se realizou a bem-sucedida 1ª Exposição de Nishigoi no Pavilhão Japonês.
Construído originalmente como elemento decorativo do conjunto do Pavilhão, o lago, antes de receber esses peixes, teve de passar por reforma completa em sua infraestrutura para garantir a qualidade da água, evitando-se a contaminação de outras fontes do entorno.
A iniciativa da construção foi de Teruo Wakabayashi (presidente da Comissão Administrativa do Pavilhão entre 1984/86) e Hisakazu Onoe, respectivamente presidente e vice-presidente da recém-fundada ABN. De acordo com Ito, o lago recebeu reforço para suportar as obras de alvenaria.
Há cerca de 30 anos, também recebeu uma capa de lona plástica fornecida pela Sansuy Indústria de Plásticos e melhorando consideravelmente as condições de criação das carpas coloridas. Até hoje a empresa tem atuado voluntariamente para reformar essas instalações oferecendo material e mão de obra especializada.
Mudanças provocadas pelo crescimento
De acordo com Seiji Ito, nos últimos anos tem diminuído drasticamente o número de voluntários dispostos a ajudar as entidades. E, além disso, o relacionamento mútuo entre essas entidades enfraqueceu.
“Acho que antes (antes dos anos de 1970), o conjunto das entidades era mais organizado, portanto, era mais fácil atuar como voluntário”, afirma, admitindo, no entanto, “que, na realidade, as entidade eram em menor número”.
De acordo com ele, “não havia uma espécie de competição entre elas, e cada empresa, ou grupo de empresas, principalmente aquelas mantidas pelos imigrantes japoneses, podiam estabelecer um tipo de rodízio informal para sua colaboração. Este ano vou ajudar tal entidade que pretende fazer determinada obra e, no próximo ano, a outra, e assim por diante”.
Ito-san acredita que “com o aumento da dimensão da comunidade, o desaparecimento das tradicionais empresas e o surgimento de novas empresas, enfraqueceu essa solidariedade informal entre as entidades e elas passaram a se preocupar consigo mesmas, buscando somente sua melhoria própria”. E, nesse sentido, “o Pavilhão Japonês, uma entidade das mais antigas, tem sofrido fases de alto e baixo tanto de verbas como de disponibilidade de voluntários”.
Confessa ainda que sua maior chateação é encontrar pessoas que não conhecem o Pavilhão, principalmente os japoneses que, ao chegar a São Paulo, deveriam procurar se informar um pouco mais sobre as coisas existentes aqui relacionadas com a terra natal deles. Além disso, acha que eles “não deveriam pensar somente em trabalhar, como também, em se dedicar ao serviço voluntário”. Para ele, “os atuais japoneses estão perdendo o espírito voluntário, tão característico e presente na cultura japonesa”.
Fazendo retrospectiva dos 53 anos como voluntário, Seiji Ito admite que “o Bunkyo, pra mim, é como se fosse a minha família, não dá mais para largar, o Pavilhão Japonês e os nishikigoi são como se fossem os meus filhos”. Viúvo, ele foi casado com Kaoru desde 1966, tem três filhos, Meire Emi, Jony Seiya e Helen Yumi e dois netos.
…e pelo menos uma vez por semana Ito-san continua indo ao Pavilhão Japonês.